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domingo, setembro 28, 2008

Metáforas sensoriais



Usar uma entrada sensorial como forma de representação de outra, quando um dos sentidos está ausente.
Beira a poesia:
Cegos que lêem com as mãos.
Surdos que ouvem com os olhos e com a alma
Compartilhar os sentidos.
Qual o espaço ocupado pelo implantado coclear na comunidade ?

Nesta condição, de implantados, vivemos em uma nova versão da realidade.
Ainda vivo uma descontinuidade de sons. Por vezes me "desligo". Por muito tempo antes do implante, foi assim. Manter a atenção contínua é um desafio. Estou me re-habituando.
Posso perceber quando isso acontece e optar por aumentar o meu grau de atenção ou continuar "vagando" e descansando a mente. Acho um pouco estranho manter uma atenção auditiva continuada, mas me dou conta disso hoje com bastante clareza.
Essa "lacuna" sonora pode ser muito importante para a opção de comunicação que o surdo irá assumir.
Penso que o surdo oralizado faz um opção de caráter tão social quanto o surdo que utiliza Libras e quer preservar uma cultura.
O surdo oralizado deseja o mundo oralizado e ama os sons. Mesmo que não os conheça bem (é preciso saber que há meandros no amor). Ama estar com os sons. Falo apenas por mim, que fiquei surda tardiamente. Amo os sons e prescindo deles.
São sete vagas de ondas sonoras e uma de silêncio.
Minhas orelhas são conchas que reverberam o sonho de ouvir.
Tenho somente um rim que filtra. É é tudo!
Tenho somente uma orelha que escuta.E é a minha âncora.
Ambos do lado direito. Meus órgãos não duplos.

Interesso-me pela comunidade surda. Sinto admiração e estranhamento pela sua não identidade com a comunidade ouvinte. Preservar a cultura surda passou a ser uma bandeira maior do que conhecer e aprender.
Qual o prazer que uma pessoa que nunca ouviu pode ter pelo som?
Que falta sentimos de algo que não conhecemos?
Parece óbvio, mas não é. O sentido do silêncio só pode ser compreendido por aqueles que vivem sob o signo do silêncio.
Os surdos sinalizados vivem sob o calor da afetividade da comunidade surda. E isso é bom.

Agora vou dizer do que não estou gostando.
Da condição de não aceitação do implantado dentro da comunidade surda.
Se os Surdos exigem respeito e valorização de sua língua e cultura, por quê não podem aceitar e respeitar a condição dos implantados?
Eu não nego a cultura surda, apenas gosto de ouvir e sinto falta dos sons, pois neste mundo vivi. Sinto falta da música, da voz do mar e das voz humana. Que mal há nisso? A língua portuguesa é a minha primeira língua.

Penso ainda que crianças surdas bem pequenas devam ser beneficiadas pela implante coclear e pela Lingua de sinais, e mais adiante, poderem escolher sobre a sua identidade.
Precisam aprender a ler e a escrever uma língua escrita que favoreça o pensamento e a linguagem escrita.


Não acredito que os surdos sejam movidos em suas decisões de implantar apenas condicionados pelo modelo médico curativo, e para serem aceitos no mundo ouvinte. O custo do implante é muito alto para os implantados, me refiro ao custo de se submeter a uma nova realidade auditiva que se baseia em estímulos elétricos e bytes.

É tudo muito diferente em meu mundo sonoro. Mas admito que ouvir novamente supera qualquer preço que esteja pagando.
Não estou consertando nada, porque a audição "original"não tem "conserto". Nunca mais ouvirei como ouvia com minhas orelhas biológicas. Dependo de um processador de voz, de programas, de uma antena receptora, de um magneto dentro da minha cabeça e de cabos e acessórios.
Estou aprendendo a "ouvir de outra forma". Quando me disseram isso pela primeira vez, achei tão misterioso e enigmático. Essa outra forma não é dada, nem é absoluta. Ela é tão relativa quanto possa ser a determinação e o desejo de escutar.
É difícil assumir que estou aprendendo a escutar a minha própria voz. Ela é uma metacognição da escuta. Quando ouço um som que não é meu, mas deveria ser, penso sobre o meu próprio som.

Quero viver com os sons, porque quero estar junto dos meus afetos, das pessoas em geral e da cultura. Quero ouvir e saber o que o outro têm a dizer. Elas não irão aprender língua de sinais, porque não faz parte da cultura delas essa língua. Isso é um fato.
Diferenças linguísticas devem ser entendidas como formas de enriquecimento entre culturas e não como a negação delas.

Interculturalidade e bilinguismo....sei. Devem ser levados a sério, dos dois lados.

E quanto a tecnologia, bem, esta não anda de ré,

Angel

2 comentários:

Anônimo disse...

Querida, A aceitação é a essência da superação. Só superamos o que podemos aceitar, mas sem acomodação,buscando outras formas de lidar com o que nos aflige, outros caminhos, um outro olhar. Para isso é preciso conhecer, saber o que nos maltrata.

Concientizar e aceitar para superar.
Você sabe o caminho, parabéns!

Anônimo disse...

Querida, A aceitação é a essência da superação. Só superamos o que podemos aceitar, mas sem acomodação,buscando outras formas de lidar com o que nos aflige, outros caminhos, um outro olhar. Para isso é preciso conhecer, saber o que nos maltrata.
Concientizar e aceitar para superar.
Você sabe o caminho, parabéns!
Monica Souto